NOVO CICLO DE EXPANSÃO DO ETANOL NO BRASIL
Algumas medidas adotadas pelo Governo Federal em 2015 – como o aumento da mistura de etanol anidro à gasolina de 25% para 27%, e mudanças nos tributos incidentes sobre o combustível fóssil, casos da elevação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em determinados estados brasileiros e do retorno parcial da Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) -, proporcionaram um certo alívio para a indústria sucroenergética, mas ainda são insuficientes para gerar um novo ciclo de crescimento no setor. Para atrair investimentos capazes de dobrar para 45 bilhões de litros a produção interna de etanol até 2023, o Brasil precisará de políticas públicas de longo prazo que definam de forma clara qual o verdadeiro papel do biocombustível da cana na matriz energética nacional.
Uma vez mais a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA), representada por sua assessora sênior da Presidência para Assuntos Internacionais, Géraldine Kutas, reforçou esta mensagem junto ao público estrangeiro, desta vez na maior conferência de etanol da Europa, a18th Annual F.O. Licht’s World Ethanol and Biofuels Conference, em Budapeste, Hungria. A participação da UNICA no evento, que reuniu aproximadamente 250 pessoas entre os dias 3 e 5 de novembro deste ano, só foi possível graças a uma parceria estabelecida desde 2008 com a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil) para promover a imagem do biocombustível brasileiro como energia limpa e renovável no exterior.
“Embora as ações do governo tenham gerado efeitos positivos imediatos, como o crescimento de 40% no consumo do etanol hidratado no acumulado de janeiro a julho, isto não significa que a produção brasileira está iniciando um novo ciclo de crescimento. Para vivê-lo, são necessárias políticas de estado que contemplem todos, e não somente alguns dos benefícios econômicos, sociais e ambientais do etanol no Brasil”, ressaltou a executiva da UNICA durante o painel “Policy Outlook”, mediado pelo secretário Geral da Associação Europeia dos Produtores de Etanol (ePURE), Robert Wright. Também participaram dos debates a representante da DG Energia da Comissão Europeia, Ruta Baltause e o diretor Executivo da Clean Fuels Development Coalition, Doug Durante.
Com sua apresentação intitulada “Competitive Brazil: Challenges and Strategies for the Biofuels Industry” (“Brasil Competitivo: Desafios e Estratégias para a Indústria de Biocombustíveis”), Kutas reforçou os desafios e soluções para se implementar uma nova fase na indústria sucroenergética do Brasil, que na próxima década terá que dobrar a sua produção anual do combustível renovável. “Se não houver medidas de longo prazo, os produtores de etanol não conseguirão atender à demanda de 45 bilhões de litros do produto em 2023, conforme meta estabelecida no Plano Decenal de Expansão de Energia (PDA), cujas projeções trabalham com um crescimento anual de 4% no consumo total de combustíveis em automóveis de passeio nos próximos oito anos. Se o segmento canavieiro não entregar este volume esperado, haverá enormes prejuízos econômicos e ambientais ao País, visto que o Brasil se verá obrigado a importar mais gasolina para suprir o mercado nacional”, observou a assessora sênior da UNICA.
Uma das medidas de longo prazo defendidas pelo segmento sucroenergético brasileiro para assegurar o pleno desenvolvimento desta indústria é o reajuste na alíquota da Cide cobrada sobre a gasolina, passando dos atuais R$ 0,10/litro para R$ 0,60/l, e um regime diferenciado nas aplicações das alíquotas do ICMS que incidem sobre o etanol e seu concorrente fóssil, como o que aconteceu este ano em Minas Gerais. Desde março deste ano, o ICMS cobrado sobre o etanol mineiro baixou de 19% para 14%, o que tornou o combustível competitivo nos postos do Estado. Questões importantes também passam pela redução dos juros e no aumento de recursos disponibilizados por algumas linhas de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Social e Econômico (BNDES), destinadas à expansão da produtividade nos canaviais e programas de estocagem de etanol.
Outro ponto apontado pela executiva da UNICA para explicar o atual momento de incerteza vivido pela indústria de etanol no Brasil está ligado à criação de barreiras comerciais e não-tarifárias em outros países. “Além das indefinições internas em relação à implementação de uma legislação mais adequada ao combustível renovável feito a partir da cana, existem fatores externos que também dificultam o acesso do produto brasileiro a mercados internacionais. Instabilidade nos marcos regulatórios europeu e americano, por exemplo, fazem parte do problema”, alertou a assessora sênior da UNICA. Em 2013, a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (Environmental Protection Agency – EPA) reduziu o volume de biocombustíveis avançados consumidos anualmente naquele país em cerca de 40%, o que afetou diretamente o etanol brasileiro, considerado de categoria avançada, à frente, inclusive, do seu similar americano produzido a partir do milho.
Oportunidade
Antes de encerrar a sua palestra na 18ª Conferência organizada pela F.O. Licht’s, Géraldine Kutas destacou a realização da 21ª Conferência do Clima (COP 21), o maior encontro ambiental do planeta, entre os dias 30 de novembro e 11 de dezembro, em Paris, como uma oportunidade única para se alavancar a participação dos biocombustíveis na matriz energética mundial. Segundo a executiva da UNICA, o Intended Nationally Determined Contributions (INDC) brasileiro, ou seja, as metas que o País terá de cumprir para reduzir 37% das suas emissões domésticas de Gases de Efeito Estufa (GEEs) até 2025, “são objetivos ambiciosos e contemplam os derivados da cana em muitos aspectos”.
No que diz respeito exclusivamente ao setor sucroenergético, o INDC brasileiro prevê, até 2030, a participação de 18% de bioenergias, incluindo o etanol carburante e demais biomassas derivadas da cana-de-açúcar, no total da matriz energética, além de um aumento de 10% para 23% no uso de energia renováveis (solar, eólica e biomassa) exclusivamente na matriz elétrica nacional. “Estou convencida de que o INDC do Brasil será cumprido, embora ainda seja necessário um alinhamento entre setor produtivo e Governo para definir como tornar estas metas em realidade, especialmente no que diz respeito ao etanol, que nos últimos anos, em função da falta de políticas públicas mais consistentes, não tem provocado muito apetite dos investidores”, concluiu a representante da UNICA.
Outros objetivos anunciados no INDC do Brasil são: o desmatamento ilegal zero no bioma amazônico; restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares; recompor um adicional de 15 milhões de hectares de pastagens degradadas; e alcançar 5 milhões de hectares de sistemas de integração lavoura-pecuária-flores