Empresas iniciam planos de contingência para hard Brexit
Com menos de dois meses até a saída do Reino Unido do bloco europeu no próximo dia 29 de março, as chances de um hard Brexit – cenário no qual o país deixaria a UE sem um acordo e sem período de transição – preocupam cada vez mais líderes políticos e o empresariado. Planos de contingência para a garantia de abastecimento e de procedimentos de fronteira avançam no Reino Unido e na Europa continental.
“Empresas em ambos os lados do Canal da Mancha não têm escolha a não ser se preparar para um hard Brexit” afirmou Dieter Kempf, presidente da Federação das Indústrias Alemãs (BDI), a jornalistas em Berlim após a derrota histórica do acordo Brexit no Parlamento Europeu. A organização destaca que um “Brexit caótico” prejudicará o crescimento econômico da Alemanha. A BusinessEurope, organização que representa a indústria do bloco em Bruxelas declarou em nota que preparações para um hard Brexit devem ser agilizadas, e que “empresas Europeias estão extremamente perturbadas com os desdobramentos […] no Reino Unido”.
Diante de possíveis interrupções de abastecimento, caso o Reino Unido se desligue do bloco europeu sem um acordo, tem sido relatado forte aumento de estoques de mercadorias por empresas britânicas nos últimos meses. Segundo a UK Warehousing Association, associação do setor de armazenagem no país, a busca por espaço de armazenamento teria experimentado um crescimento brusco no último trimestre de 2018.
Planos de contingência estão sendo implementados nos mais diversos setores. Empresas como a rede de supermercados Tesco alugaram containers para congelados fora de seus estabelecimentos até o final do ano, prática que costuma ocorrer na época de Natal, quando há forte demanda. A gigante Marks & Spencer também teria anunciado estoques de não-perecíveis. A plataforma Amazon recomendou a comerciantes que utilizam o e-commerce que enviem estoques aos armazéns na Europa continental. Empresas do setor farmacêutico, como Sanofi e GlaxoSmithKline, do setor automobilístico, como Bentley, a fabricante de bicicletas Brompton, entre outras marcas nos mais variados setores, também declararam planos de acúmulo de estoques pré-Brexit.
Um vídeo publicado pela empresa Airbus ganhou especial repercussão ao veicular mensagem do CEO Tom Enders afirmando que a organização teria que tomar decisões “potencialmente muito prejudiciais ao Reino Unido” caso este deixe o bloco europeu sem um acordo. “Há muitos países lá fora que adorariam produzir asas para aeronaves Airbus” afirmou o CEO. As declarações provocaram represália por apoiadores do Brexit em Westminster e foram ovacionadas nas mídias sociais pela oposição.
Segundo estimativas do Rabobank, o preço dos alimentos deverá subir, caso empresas britânicas percam seu acesso ao mercado europeu em um cenário hard Brexit. Os custos para atravessar a fronteira estariam entre os motores de uma possível inflação. Atualmente, cerca de metade dos alimentos consumidos no Reino Unido são importados, dos quais 80% são originários da UE e 90% entram pelo porto de Dover, através do Canal da Mancha.
O banco prevê ainda complicações para empresas britânicas diversificarem seus fornecedores para além da UE no curto prazo, devido à dificuldade dos demais países em se adequar aos padrões do mercado local. Açúcar bruto seria o único produto que poderia passar a ser importado de fora do bloco, segundo a análise.
No âmbito governamental, a França anunciou que aprovaria medidas para proteger os direitos de cidadãos e empresas francesas no caso de um hard Brexit. Segundo o Primeiro Ministro francês, Édouard Philippe, legislação seria adotada para garantir a infraestrutura emergencial necessária para dar sequência ao controle aduaneiro, principalmente em termos de segurança alimentar, nos principais pontos de entrada no país. Novas regras permitiriam ainda reduzir formalidades na fronteira para amenizar a formação de filas no controle aduaneiro.
A Comissão Europeia também seguiu em frente com planos de contingência para um cenário
no-deal. Na semana seguinte à votação do acordo, foram publicadas duas propostas de medidas visando reduzir o impacto sobre o setor de pesca. A primeira permitirá a pescadores europeus solicitarem compensação caso tenham que cessar suas atividades em mares britânicos. A segunda propõe um procedimento simplificado para que navios britânicos possam pescar em mares europeus até o fim de 2019, dado que o país garanta o mesmo acesso a navios europeus.