Grupo de estados-membros fará análise conjunta sobre glifosato



Um grupo de quatro países – França, Hungria, Países Baixos e Suécia – será responsável por avaliar a segurança do herbicida glifosato na próxima renovação de sua licença de comercialização na UE. O grupo foi designado com unanimidade por experts dos 28 estados-membros e substituirá a Alemanha nesse papel. Grupos da sociedade civil acusam a autoridade sanitária alemã de ter se baseado demasiadamente em estudos fornecidos pela indústria em análises anteriores.

Visando a apresentar até junho de 2021 um relatório preliminar à Autoridade Europeia de Segurança Alimentar (EFSA), os países iniciarão o trabalho de análise em 2020. A EFSA adotará então conclusões sobre a renovação da licença do herbicida, que deverá ser votada por todos os estados-membros em dezembro de 2022.

A licença do glifosato, o herbicida mais utilizado no mundo, foi renovada na UE em 2017 por um período de cinco anos. O processo ocorreu em meio a grandes controvérsias, tendo a aprovação sido viabilizada apenas após o representante alemão no comitê técnico responsável ter mudado seu voto, contrariando instruções de Berlim.

Incerteza permeia renovação da licença do glifosato; países buscam alternativas

Diante da crescente desconfiança com relação à segurança do herbicida, a renovação da licença de comercialização do glifosato em 2022 está longe de certa. Estados-membros já têm se mobilizado para abordar essa questão em nível nacional. No ano passado, o governo francês estabeleceu a meta de reduzir o uso de defensivos químicos pela metade no país até 2025 e de descontinuar o uso de glifosato, “na maior parte dos casos”, até o fim de 2020.

No dia 10 de abril, a França lançou um comitê especial para implementar as metas estabelecidas. Segundo o Ministro da Agricultura do país, Didier Guillaume, será criada também uma força tarefa reunindo os setores público e privado para encontrar formas de reduzir o uso de produtos fitossanitários. Guillaume afirmou que o governo oferecerá instruções a agricultores franceses sobre como acessar fundos para financiar a transição a um modelo de produção com menor uso de defensivos. Também terá início no país um programa de pesquisa em busca de alternativas a defensivos.

Na Alemanha há um movimento similar, embora diferenças entre os ministérios da agricultura e do meio ambiente tenham emergido quanto aos prazos para que o herbicida seja descontinuado. “Queremos uma suspensão [do glifosato] através da UE uma vez que a atual licença de cinco anos tenha expirado” afirmou o porta-voz do Ministério do Meio Ambiente do país. “Até lá, [o glifosato] só deve ser utilizado sob certas condições para que seja evitado o impacto intolerável na biodiversidade”, informou.

Contexto

A EFSA concluiu em 2015 que o glifosato não apresenta riscos à saúde humana. No mesmo ano, porém, a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC), que faz parte da Organização Mundial da Saúde, listou o herbicida como “provavelmente cancerígeno”. Desde então a metodologia da EFSA tem sido criticada por grupos da sociedade civil, que alegam haver pouca transparência e independência nas análises da organização

No último mês de março, a empresa alemã Bayer, gigante do setor químico e farmacêutico, foi condenada a pagar USD 80 milhões a um paciente de câncer após um júri do Tribunal Federal de São Francisco, no estado da Califórnia, nos Estados Unidos, determinar ligação entre o desenvolvimento da doença e a exposição prolongada ao herbicida Roundup, cujo ativo é o glifosato. Em um caso similar, em agosto do ano passado, um júri estadual, também na Califórnia, condenou a empresa a pagar uma indenização de USD 289 milhões, mais tarde reduzida a USD 78 milhões, a um paciente de câncer após evidenciar o papel do herbicida no desenvolvimento da doença.

Atualmente há mais de treze mil processos similares sobre o glifosato em andamento em tribunais nos Estados Unidos. A Bayer adquiriu a empresa americana Monsanto, fabricante do Roundup, em junho do ano passado, por USD 66 bilhões. Acionistas da Bayer expressaram descontentamento com o que hoje interpretam ter sido uma subestimação dos riscos legais da aquisição. As ações da Bayer caíram 40% desde agosto do ano passado, após a primeira decisão judicial contra a empresa, correspondendo a uma perda de EUR 30 bilhões.

No Brasil, o glifosato é o amplamente usado no cultivo de grãos, especialmente na plantação de soja transgênica. A proibição do glifosato na Europa poderia ter impacto direto nas exportações brasileiras. Em 2018, o Brasil exportou cerca de 5 milhões de toneladas de soja para a União Europeia.