Visão para a Agricultura e Alimentação Europeia
Em 19 de fevereiro, a Comissão Europeia apresentou a “Visão para a Agricultura e Alimentos“, um documento estratégico que busca definir os rumos do setor agroalimentar da União Europeia pelos próximos 15 anos.
Essa iniciativa surge em um momento de forte pressão dos agricultores europeus, que exigem melhores condições de renda e maior proteção frente à concorrência internacional. A nova visão tem quatro pilares: a criação de um setor agrícola mais atrativo e previsível, a construção de uma indústria competitiva e resiliente, a garantia de práticas sustentáveis dentro dos limites ambientais e a valorização dos alimentos, das condições de trabalho e das áreas rurais (link).
- Diversificação das importações e potenciais implicações para o Brasil
Um dos aspectos centrais desse documento é o reconhecimento, por parte da Comissão Europeia, de que o mundo vive uma crescente fragmentação, onde dependências excessivas podem se tornar vulnerabilidades estratégicas.
Nesse contexto, a UE reforça sua intenção de fortalecer a soberania alimentar, reduzindo a concentração de fornecedores para insumos críticos, como fertilizantes, ração animal e energia (página 11). Entre os produtos considerados sensíveis, destaca-se a proteína de alta qualidade importada por um número limitado de países.
Embora o Brasil não seja mencionado diretamente no documento, dados da própria União Europeia confirmam a relevância do país para o abastecimento agroalimentar do bloco.
- Em 2023, o Brasil foi o principal fornecedor de produtos agrícolas para a UE, respondendo por 11% das importações totais do setor.
- Um dos principais itens dessa pauta é a soja, classificada pela própria Comissão como um produto estratégico pois é um insumo usada para “ração animal”.
Essa ênfase na diversificação de fornecedores pode representar desafios para as exportações brasileiras, especialmente se a UE buscar alternativas em outros mercados. Um exemplo ocorreu em 2018, quando a UE, sob a presidência de Jean-Claude Juncker, enfrentava uma escalada nas tensões comerciais globais com os Estados Unidos. Naquele momento, a União Europeia anunciou sua disposição de aumentar significativamente a compra de soja norte-americana, como parte de um esforço para aliviar as tensões com os EUA e manter um equilíbrio comercial favorável. Do ponto de vista interno, visão de Hansen inclui uma nova estratégia de proteínas para impulsionar as proteínas vegetais cultivadas na UE.
- Possíveis novas exigências sobre padrões de produção
Além da questão da diversificação de fornecedores, outro ponto de grande impacto para as exportações brasileiras é a intenção declarada da Comissão Europeia de alinhar mais rigidamente os padrões de produção aplicados aos produtos importados. O documento menciona, em particular, a necessidade de estabelecer novas regras sobre defensivos agrícolas e bem-estar animal, buscando maior reciprocidade entre as exigências impostas aos produtores europeus e aquelas aplicadas aos produtos provenientes de países terceiros.
Entre as medidas que estão sendo consideradas, destaca-se a proibição da importação de produtos que contenham substâncias químicas e defensivos agrícolas banidos na UE. Além disso, a Comissão declarou que avaliará a questão da exportação, por empresas europeias, de produtos químicos perigosos que são proibidos no mercado interno, o que pode levar a novas restrições regulatórias.
Embora ainda não existam medidas concretas, a UE anunciou que apresentará, ainda em 2025, uma proposta para aprofundar o princípio de reciprocidade, iniciando uma avaliação de impacto para medir as implicações competitivas e comerciais dessas medidas.
Especialistas do próprio bloco já alertaram sobre os riscos legais dessas iniciativas. O ex-diretor de Relações Internacionais da Direção-Geral de Agricultura da Comissão Europeia, John Clarke, classificou algumas dessas propostas como potencialmente ilegais à luz das normas da Organização Mundial do Comércio (OMC), além de alertar que essas restrições podem gerar efeitos negativos para os próprios agricultores europeus. Nesse contexto, a CELCAA, entidade que representa os comerciantes de produtos agroalimentares da UE, parece também compartilhar essa visão, alertando que impor padrões de importação mais rígidos poderiam desencadear disputas na OMC e retaliações comerciais.
Em resposta a um questionamento da imprensa sobre motivos de saúde para alinhar o uso de pesticidas em produtos importados e domésticos, dado que a Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar considera seguras as importações cujos resíduos de pesticidas estejam abaixo dos limites máximos de resíduos (MRL), Hansen declarou: “Os produtos precisam ser aplicados corretamente, e isso talvez tenha levado no passado a algumas contaminações.” A declaração parece sugerir que os controles da UE nem sempre detectam níveis que ultrapassem os limites de MRL.